
Deputado Aldo Rebelo é aplaudido após aprovação do texto-base (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
Depois de aprovar o texto-base do Código Florestal, a Câmara dos Deputados aprovou também uma emenda proposta pelo PMDB que, entre outras alterações, permite que os governos estaduais legislem sobre a ocupação de Áreas de Preservação Permanente (APP). O governo era contra a aprovação do dispositivo - quer a prerrogativa de legislar sobre APPs para si -, mas foi derrotado pelos votos da oposição e da maior parte da base aliada. Foram 273 a favor, 182 contra e 2 abstenções.
A maior parte dos aliados deixou o Planalto falando sozinho na votação da emenda. Agora, o governo joga as fichas no Senado para reverter as alterações feitas pelos deputados federais. Em caso de novas mudanças, o texto volta à Câmara. Como último recurso, a presidente Dilma Rousseff já deixou claro que vetará itens que desagradem ao Planalto.
Ameaça - Em plenário, o líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN), disse que a posição de seu partido não significa uma traição: "Eu não sou um aliado do governo. Eu sou governo. Não aceito que digam que estamos derrotando o governo. Como, se a proposta é nossa?" O líder do governo na casa, Cândido Vaccarezza (PT-SP), subiu à tribuna em seguida, com a difícil tarefa de reverter o quadro, que prenunciava uma derrota. E apelou abertamente à autoridade da presidente: "A Casa fica sob ameaça quando o governo é derrotado. Nós fomos eleitos na mesma chapa da presidente Dilma em que estava o Henrique Eduardo Alves", afirmou.Segundo Vaccarezza, a presidente Dilma Rousseff achou uma "vergonha" a proposta que a Câmara tendia a aprovar. Aldo Rebelo (PC do B-SP) pediu que o presidente Marco Maia (PT-RS) interpelasse o líder do governo para que confirmasse a declaração. Duarte Nogueira (SP), líder do PSDB, também reagiu: "Vergonha é o governo esconder seus representantes de primeiro escalão suspeitos de ter aumentado 20 vezes o seu patrimônio", afirmou, em referência ao ministro Antonio Palocci.Ao contrário da última tentativa de votação do Código, desta vez a intervenção de Vaccarezza não convenceu a base aliada. O governo sai da votação do Código Florestal desgastado e com incertezas sobre o tamanho real de sua bancada na Câmara.Repercussão - Após a sessão, que durou 14 horas e acabou pouco depois da meia-noite desta terça-feira, Vaccarezza disse não ter visto problemas na declaração em que citou a presidente Dilma. Negou ter agido de forma autoritária e voltou a criticar a emenda aprovada pela Casa: "O texto abre brechas para o desmatamento", afirmou, lembrando que o Planalto deve vetar propostas que beneficiem desmatadores e que permitam a ocupação descontrolada de áreas de preservação.O relator Aldo Rebelo considerou previsível a divisão da base aliada: "Era natural que houvesse polêmica em torno dos destaques". Mas o líder do DEM, ACM Neto (BA), não tem dúvidas: a posição de Vaccarezza pesou na decisão final dos deputados: "O discurso do líder do governo gerou um extremo desgaste. Ele usou termos ameaçadores."O atual Código Florestal brasileiro está em vigor desde 1965, quando o país estava sob o regime ditatorial. Alguns artigos foram alterados, mas, ainda assim, o texto é considerado fora da realidade tanto por ambientalistas quanto por ruralistas. A renovação do código é discutida desde 1999 no Congresso Nacional

O Código Florestal determina as regras ambientais a serem seguidas por produtores rurais no Brasil. A primeira versão foi criada em 1934, por decreto, quando surgiram as definições iniciais de áreas de vegetação natural a serem preservadas em propriedades privadas. Em setembro de 1965, durante o regime militar, o código que está em vigência atualmente foi instituído pela lei 4.771. Ele criou, entre outras coisas, as delimitações de Reserva Legal (RL) e Área de Preservação Permanente (APP). Desde então, passou por diversas modificações pontuais feitas por medidas provisórias e leis específicas, que restringiram as áreas de desmatamento em florestas e tornaram crime ambiental o que até então era considerado infração.

No final dos anos 90, as discussões sobre uma mudança completa no código se intensificaram no Congresso Nacional. Em 1999, o deputado Sérgio Carvalho apresentou o projeto 1.876, que reformularia os principais pontos da lei. Nos 12 anos seguintes, a proposta teve dez outros projetos apensados e foi analisado por todas as comissões permanentes pelas quais deveria passar. Em 2009, foi criada uma comissão especial para analisar o projeto a fundo. Após 67 audiências públicas em todo o país, o substitutivo final foi elaborado pelo relator Aldo Rebelo (PC do B – SP). Em junho de 2010, o texto foi aprovado pelos integrantes da comissão e, desde então, está pronto para entrar na pauta de votação do plenário.

Quando estava em campanha pela presidência da Câmara, no início de 2011, o deputado federal Marco Maia (PT-RS) prometeu a ambientalistas e ruralistas que colocaria o código em votação o mais rápido possível. Após eleito, criou uma câmara de negociação, com integrantes de ambos os lados e fez nova promessa: o texto seria votado até o fim de março. As audiências públicas sobre o tema e as discussões, que dividiam até representantes do alto escalão do governo, renderam mais que o esperado. O grupo recebeu 55 sugestões de mudanças do texto de Aldo Rebelo e somente.

Os maiores interessados em agilizar a votação do projeto são os agricultores e pecuaristas, que estão com a corda no pescoço por causa do decreto 7.029/2009. De acordo com a determinação, a partir de 12 de junho de 2011, propriedades rurais que não registrarem em cartório a existência de uma reserva legal com o percentual mínimo exigido pela legislação em vigor serão consideradas irregulares e ficarão sujeitas a multa diária, inviabilizando um setor vital da economia brasileira. Segundo ruralistas, 90% das propriedades do país não conseguiram se adequar à regra porque já haviam desmatado mais quando a lei assim permitia. O novo código poderá isentar de punições os pequenos proprietários e os que desmataram além do permitido até julho de 2008, data da primeira versão do decreto.