07 maio 2011

Profusa em histórias, falta a 'Insensato Coração' o básico: um fio condutor

Henrique (Ricardo Pereira) esfaqueia Tia Neném (Ana Lúcia Torre) em mais um conflito da trama

Henrique (Ricardo Pereira) esfaqueia Tia Neném (Ana Lúcia Torre) em mais um conflito da trama (Divulgação/TV Globo)

Quem assiste a Insensato Coração desde o início da novela, em janeiro deste ano, já perdeu a conta de quantos enredos paralelos cumpriram seu ciclo – nasceram, cresceram e morreram. Quem nunca viu o folhetim, então, é capaz de se sentir perdido ao tentar acompanhá-lo por dias seguidos. Não dá para saber qual é – e se há – o enredo principal. A aposta de Gilberto Braga e Ricardo Linhares numa estrutura narrativa desconexa, marcada por temas fortes e duros (saiba mais sobre a crise do realismo), tem rendido aos autores frutos para lá de amargos, como a audiência abaixo do padrão do horário nobre.

Acadêmicos, colegas de profissão dos autores, especialistas em TV e noveleiros de plantão são unânimes em criticar a produção. Um renomado dramaturgo, que pediu anonimato, chegou a chamar Insensato Coração de “colcha de retalhos”, pela falta de um fio condutor que amarre o telespectador à novela. “Falta uma linha central que o público possa acompanhar e com a qual se identificar. A novela é feita de várias histórias que surgem e se perdem”, afirmou.

O capítulo do último dia 4, por exemplo, foi centrado no personagem Horácio Cortez, o corrupto banqueiro interpretado por Herson Capri. Contente depois de abortar uma investigação da Polícia Federal por meio de suborno, ele se refestela numa coletiva de imprensa e no quarto com a namorada Natalie Lamour (Deborah Secco). No final do capítulo, recebe uma ligação do chantagista Henrique Taborda (Ricardo Pereira) e sobem os créditos. O par romântico Marina Drumond (Paola Oliveira) e Pedro Brandão (Eriberto Leão) quase não aparece. O vilão Léo, muito menos. Os irmãos Pedro e Léo, releituras de Esaú e Jacó, são personagens centrais da trama, mas por vezes não aparecem na novela que, em teoria, protagonizam.

É difícil de acreditar, mas, de acordo com os autores, a dinâmica é proposital. “Esta é uma característica de Insensato Coração. É uma história escrita com muitos acontecimentos e desdobramentos. O enredo imprime a velocidade”, dizem por e-mail Braga e Linhares.

A saída de Norma (Glória Pires) da prisão promete uma reviravolta no curso da novela A saída de Norma (Glória Pires) da prisão promete uma reviravolta no curso da novela

A esperança da virada – Nos últimos dias, Insensato Coração obteve índices melhores no Ibope, com 38 e até 39 pontos na Grande São Paulo. Os números, no entanto, não alteram o resultado geral da trama, até aqui um fiasco para os padrões globais do horário. A esperança é que a virada de Norma (Glória Pires), personagem que foi usada pelo vilão Léo, cumpriu pena por causa dele e agora quer se vingar, aqueça a trama. Se isso ocorrer, Norma será a exceção que confirma a regra, já que é a única personagem cuja evolução se pode acompanhar durante a novela. Diferentemente dos outros, ela não abortou relações e iniciou outras, nem paralelamente: Norma está desde o começo ligada a Léo.

“Os autores deveriam ter antecipado a saída de Norma da cadeia e o início da sua vingança”, diz Cintia Lopes, noveleira e co-autora do livro A Seguir, Cenas do Próximo Capítulo. Cintia ainda dá uma dica preciosa a Gilberto Braga: ouça o colega Silvio de Abreu. Os dois têm o costume de se reunir em momentos de crise, em encontros sutilmente batizados de "ajuda teu irmão". “Eles discutem rumos alternativos para a história ou soluções para um determinado personagem”, conta. Segundo Cintia, as reuniões costumam surtir efeito nas tramas que estão no ar. Braga e Abreu precisam muito conversar.